Tolerância Zero

Com a conjuntivite ardendo, Marido entra numa farmácia. Receita na mão se dirije ao balcão, com aquele péssimo humor que lhe é peculiar. Ele nem abre a boca, entrega a receita à moça, que lhe "pergunta", atenciosamente: "Isso é colírio?". O tempo fechou na hora. "Tu que trabalhas aqui nesta farmácia não sabe, e eu é que tenho que te dizer!? Eu não vou te dizer, vai perguntar à tua supervisora e cuidado para não me entregar o remédio errado, ouviste?" Quando eu digo que Marido é grosso todo mundo fica com dozinho dele, eu com aquela cara de a-malvada-maltradora-de-homens-mal-agradecida. Para exemplificar o baixo nível de tolerância de Marido conto uma outra anedota:
Liga a moça da Magazine para cobrar um tal de G... que não mora aqui. A moça estava ligando pela quinta vez, acho que o cadastro deles está com o telefone daqui. Ouço a seguinte resposta: "Eu já falei que não mora nenhum G... aqui! Oiça bem o que eu vou lhes dizer, a próxima vez que ligarem aqui eu vos processo ouviu bem?" A moça ainda ensaiou uma desculpa mas ele foi categórico: "Eu não tenho nada a ver com a incompetência de vocês em manter o cadastro certo, ouviste, a próxima vez eu vos processo!".
Quando a rispidez dele se volta para mim, nos desentendemos imediatamente já que também não tolero este tom de arrogância, sinto-me agredida. Expresso-me utilizando confirmações inúteis, hiperbólicas, como quase a totalidade da população brasileira: "Tem certeza que não quer, está tão gostoso!"; "Eu gostaria de... [gostaria, não quer mais?]; "Oi, amor, já chegou?"[cheguei não, estou na esquina]; "Adivinha quem eu vi na rua?"[não tenho bola de cristal], etcétera. Realmente existem frases e silêncios mais eficazes, mas quem disse que eu quero eficácia? Eu quero é intimidade, proximidade, beijo na boca. Já pensou que chato se eu não pudesse insistir em oferecer um cafezinho às minhas visitas? O complicado é que o meu jeito de falar irrita Marido de uma forma inacreditável. Notei que uso um vocabulário hiperbólico: demais, suuuper, oooover, milhares, milhões, érrimo, íssimo, issíssimo. Costumo repetir duas vezes as frases. Notei isso, foi bom ter notado, porque estou me policiando. É tão bonito ver uma moça falando num tom suave, apropriado e correto.

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